Oi / Hi

Olá, leitores! Faz tempo que não posto aqui no MixLit. É porque o trabalho me levou para novos rumos. Venho realizando uma série de oficinas e estou ocupado vertendo os textos do MixLit para colagens físicas, como vocês podem ver no meu site completo http://cargocollective.com/leonardovillaforte
Além disso, estou preparando o lançamento do meu segundo livro (depois de “O explicador”), um romance, que sairá no dia 5 de novembro de 2015 pela editora Oito e Meio. Também terminei a minha pesquisa de mestrado e estou buscando editora para publicar o livro-ensaio “Escrever sem escrever: a literatura de apropriação”.

Então, é isso. Até! Abraços,

Leonardo.

Hi, readers! It’s been a while since I don’t post here at MixLit. My work has taken me to new directions. I’ve been giving a series of workshops and I’ve been turning these MixLit texts into physical collages, as you can see in my full site: http://cargocollective.com/leonardovillaforte

I’m also preparing the launch of my second book (after “O explicador”), which will be my first novel. It ill be released this november by Oito e Meio publisher. I’ve finished my master’s research and I’m looking for a publish house to launch “Writing withtout writing: the appropriation literature”.

So, that’s it. See you! All the best,

Leonardo.

Novidades

Queridos seguidores do MixLit,

faz tempo não posto no blog. Isso não acontece porque parei de fazer o trabalho de literatura remixada, mas sim porque o trabalhou se desdobrou e caminha por novos trilhos. Um deles: meu projeto de mestrado. Entrei no mestrado em “Literatura, cultura e contemporaneidade” na PUC-RJ, no início de 2013, e agora ando estudando bastante para escrever uma boa dissertação. O assunto? Remix, apropriação e intervenção na literatura. Ou seja, no início de 2015 espero ter uma boa quantidade de páginas discutindo a ideia de autor como um montador (o autor-DJ) a partir da minha experiência com o MixLit e outros trabalhos de outros artistas que dialogam com a ideia de tratar o texto como algo móvel, manipulável e “misturável”.

Outro desdobramento do MixLit: as oficinas. Tenho recebido convites, e uma boa oficina requer um bom planejamento. Esse mês de abril, por exemplo, dei uma oficina para 100 alunos do 8o ano da Escola Parque da Barra da Tijuca. Acho que a garotada se amarrou. Em julho, darei uma nova oficina na 3a Bienal de Arte da Bahia, no Museu de Arte Moderna de Salvador. E daí por diante.

Quero falar ainda de um outro trabalho meu, que também é um desdobramento do MixLit. Mas antes disso, não gostaria de deixar vocês sem nenhuma novidade do próprio MixLit: o último MixLit postado aqui foi feito especialmente para uma revista da Inglaterra, a Modern Poetry in Translation, e agora que a edição já saiu, posso publicar aqui também a versão visual desse trabalho.

MixLit 70 - Mudança - sem site - Leonardo Villa-Forte

A edição da Modern Poetry in Translation traz ainda autores brasileiros que admiro bastante: Carlos Drummond de Andrade, Angélica Freitas, Adriana Lisboa, Nicolas Behr, Ana Martins Marques… vocês podem reparar que usei alguns deles para fazer esse poema MixLit. Além desse trabalho, a revista publicou também uma conversa minha com a tradutora norte-americana Hilary Kaplan – que traduz os livros da poeta brasileira Angélica Freitas. Segue aqui o link para a conversa – na qual falamos bastante sobre meu método e minhas intenções com o MixLit. Ficou ótima! Se você lê em inglês, recomendo clicar aqui: http://www.mptmagazine.com/feature/a-small-library-in-a-poem-a-conversation-66/

Quanto ao meu novo trabalho, ao invés de recortar trechos das páginas e conectá-los para fazerem sentido – como no MixLit -, neste novo trabalho eu uso páginas inteiras, sem recortá-las, mas marcando seus trechos mais interessantes (na verdade eu e vários colaboradores – Lopes, Ana Hupe, muitos outros), e disponho as páginas em muros da cidade sem a obrigação de elas construírem uma narrativa harmônica ao ficarem uma do lado da outra. Conheçam, aqui, o Paginário.

 

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Já temos quatro Paginários pela cidade e estão aparecendo convites para fazermos mais. Assim, estou com dois sites novos e gostaria de convidá-los para conhecerem.

O primeiro é o site do Paginário: www.paginario.com.br – que também conta com uma comunidade no Facebook. Procure no Facebook por “Paginário”.

O segundo é o meu site, que reúne muitos dos meus trabalhos até agora: www.leonardovillaforte.com

Obrigado pela companhia!

Grande abraço,

Leonardo Villa-Forte.

 

MixLit 70: Mudança

Homens célebres visitam a cidade                                                           rebatedor-circular-5x1_1_
Obrigatoriamente exaltam a paisagem1
As luzes cinéticas das avenidas
O vulto ao vento das palmeiras
E a ânsia insaciável dos jasmins2    

Tudo igual
Tudo rebocado
Só muda a cor3

Por muito tempo o tempo não passa4
O poema bom
O poema ruim5

Vou vestir as roupas da coleção do inverno passado6
Se um dia eu tiver que voltar
Para o lugar de onde vim7

____________________

1 Carlos Drummond de ANDRADE. Sentimento do mundo. Companhia das Letras, 2012, p.45.
2 Antonio CÍCERO. A cidade e os livros. Record, 2002, p.77.
3 Angélica FREITAS. Um útero é do tamanho de um punho. Cosac Naify, 2012, p.45.
4 Leda CARTUM. As horas do dia – Pequeno dicionário calendário. 7Letras, 2012, p.46.
5 Nicolas BEHR. Meio seio. Língua Geral, 2012, p.50.
6 Ricardo DOMENECK. a cadela sem Logos. 7Letras/Cosac Naify, 2007, p.95.
7 
Fabrício CORSALETTI. Esquimó. Companhia das Letras, 2010, p.49.

MixLit 69: Encontro

Uma mulher nos abriu a porta. Era a mulher que fazia os serviços da casa.1 Usava um tipo de saia espanhola com muitas cores e uma espécie de bustiê.2 Para tirar o cheiro da gordura da chapa em que trabalhava, ela ensopava de creme rinse o cabelo meio louro, meio preto.3 Parecia realmente maravilhosa.4 Fiquei paralisado.5 O que conversar? Como puxar assunto?6 Eu estava com medo, claro. Sentia medo de, por causa de um movimento infeliz,7 não me dar bem.8 Depressa, homem, depressa – balbuciei, quase sem fôlego.9 Bateu aquele frio na barriga. Respirei profundamente e caminhei10 com um olhar brilhante, impenetrável. Inclinei-me para beijá-la.11

Bruce-French_Darkness-is-the-Absence-of-Light,-Orange– Fora daqui – murmurou.12

– Não.

– Você está pálido.

– Eu sou pálido. Vamos, ande.13 Não vou assustá-la de novo.14

– Você sabe muito bem que tudo vai piorar.15

Eu estava entregando os pontos. Teria entregado os pontos se não fosse uma voz que se fez ouvir no meu coração. Essa voz dizia:16 ela precisava da minha companhia.17

– Quando voltarei a vê-la?

– Telefono para você amanhã ou depois – disse ela.18

O meu rosto assumiu uma expressão severa e determinada.19

– Promete?

Ela assentiu.

– Pode ligar para a minha casa ou a livraria. O número é o mesmo. Você tem, não é?20

Marquei de pegá-la na saída do trabalho.21

Nunca mais nos encontramos.22


1 João Gilberto NOLL. Hotel Atlântico. Em: Romances e contos reunidos. São Paulo: Companhia das Letras, 1997, p.408.

2 Meg CABOT. O diário da princesa, Vol.1. Tradução de Fabiana Colasanti. Rio de Janeiro: Record, 2002, p.136.

3 Marcus Vinícius FAUSTINI. Guia afetivo da periferia. Rio de Janeiro: Aeroplano, 2009, p.86.

4 Meg CABOT. Idem.

5 Carlos Ruiz ZAFÓN. A sombra do vento. Tradução de Marcia Ribas. Rio de Janeiro: Suma de Letras/Objetiva, 2007, p.256.

6 Thalita REBOUÇAS. Ela disse, ele disse. Rio de Janeiro: Rocco, 2010, p.9.

7 Ricardo LÍSIAS. Anna O. e outras novelas. São Paulo: Globo, 2007, p.16.

8 Meg CABOT. Idem.

9 Yann MARTEL. As aventuras de Pi. Tradução de Maria Helena Rouanet. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2012, p.180.

10 Thalita REBOUÇAS. Idem.

11 Carlos Ruiz ZAFÓN. Idem, p.257.

12 Carlos Ruiz ZAFÓN. Idem, p.256.

13 Carlos Ruiz ZAFÓN. Idem.

14 Rick RIORDAN.  Percy Jackson e os Olimpianos – O mar de monstros.  Tradução de Ricardo Gouveia. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2009, p.278.

15 Rick RIORDAN. Idem.

16 Yann MARTEL. Idem.

17 Thalita REBOUÇAS. Idem.

18 Carlos Ruiz ZAFÓN. Idem.

19 Yann MARTEL. Idem.

20 Carlos Ruiz ZAFÓN. Idem, p.257.

21 Marcus Vinícius FAUSTINI. Idem.

22 Marcus Vinícius FAUSTINI. Idem.
__________________________________

Este MixLit foi feito com os livros escolhidos para as seis oficinas de remix literário que dei durante a semana de dia das crianças no SESC Barra Mansa, Rio de Janeiro. Aproximadamente 100 estudantes, de 8 a 15 anos, remixaram essas mesmas páginas, montando seus próprios textos a partir das mesmas fontes.

MixLit 68: Os espaços

Ela, prazerosa, no esplendor do seu sorriso1 costumava dizer: “A vida é espantosamente curta.2 Você chegou a tempo de eu perceber que não deveria desistir.”3

Não deu certo.4 MixLit 68 - imagem

Senti que estávamos separados não há três meses, mas há três anos. Pensei em como seria difícil conhecer outra pessoa, descobrir outro corpo, sem brotoejas na nuca, sem cicatriz na perna, sem manchas de sol nas costas, sem calos nos dedos.5

As pessoas separam, seguem sua vida, se mudam.6 As mulheres deixam de amar.7 Uma coisa que eu não aprenderia nunca.8

Pelo menos estou tentando resolver isso…9  

Dar nomes para o espaço entre as coisas.10

Estou tentando!11

 


1 ONDJAKI. E se amanhã o medo. Rio de Janeiro: Língua Geral, 2010, p.73.

2 Franz KAFKA. Um médico rural. Tradução de Modesto Carone. São Paulo: Companhia das Letras, 2003, p.40.

3 Paulo SCOTT. Habitante irreal. Rio de Janeiro: Objetiva/Alfaguara, 2011, p.215.

4 Saul BELLOW. Herzog. Tradução de José Geraldo Couto. São Paulo: Companhia das Letras, 2011, p.67.

5 Danielle SCHLOSSAREK. Irene na multidão. Rio de Janeiro: Oito e meio, 2013, p.19.

6 Dash SHAW. Umbigo sem fundo. Tradução de Érico Assis. São Paulo: Companhia das Letras, 2009, sem número de página, início da “Parte 2”.

7 Saul BELLOW. Idem, p.65.

8 Laura ERBER. Esquilos de Pavlov. Rio de Janeiro: Objetiva/Alfaguara, 2013, p.113.

9 Dash SHAW. Idem.

10 Waltercio CALDAS. Manual da ciência popular. São Paulo: Cosac Naify, 2007, página sem número, seção “21 – A estória da arte”.

11 Dash SHAW. Idem, página seguinte à usada anteriormente.

MixLit 67: As agruras de mamãe

Estávamos apertados uns contra os outros perto da lareira quando, de repente, minha mãe se levantou, desequilibrando toda a turma; surpresos, nós a vimos dirigir-se para a porta e, movida por um obscuro impulso, escancará-la.1 Ela ficou ainda um tempo com um sorriso no rosto. Alçou os ombros ligeiramente. Foi à janela, o olhar cansado e vazio:

– Talvez eu deva ouvir música.2

Pôs as mãos para trás, ficou na ponta dos pés, como se quisesse enxergar algo, mas era só um gesto de irritação.3

– Agora o que é que eu vou fazer? – perguntou com a voz esganiçada.4

– É isso aí, mãe. Vai em frente e xinga! Nós não nos importamos!5

hair-window - Michael Landau - KreativMichael

– Quando isso acontecer, Mis’Salim, vou saber que chegou a hora de6 sair de casa.7

Era uma maneira estranha de pensar. Mas ela era uma mulher estranha.8 Costumava dizer que uma mulher devia se sentir feliz no seio da sua família. Mas, como9 disse tio Ran10, o que uma mulher quer, para começar, é ter seu próprio círculo de relações, e11 mamãe não12 saía para ver ninguém.13 Passava a maior parte do tempo em seu quarto, com a porta trancada por dentro, mas de vez em quando emergia numa espécie de exaltação bêbada,14 voltava à costura de moldes baratos, à solidão de uma atividade cada vez mais anacrônica, sem perder o ânimo, nem o orgulho de quem passara a vida cortando e emendando tecidos. Dizia que muitas pessoas dançavam, marchavam, estudavam e se divertiam com roupas feitas por ela.15

 


1 Muriel BARBERY. A elegância do ouriço. Tradução de Rosa Freire D’Aguiar. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p.307

2 Clarice LISPECTOR. Perto do coração selvagem. Rio de Janeiro: Rocco, 1998, p.92.

3 Milton HATOUM.  Cinzas do norte. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, p.24.

4 J.K. ROWLING. Harry Potter e a pedra filosofal. Tradução de Lia Wyler. Rio de Janeiro: Rocco, 2000, p.137.

5 Bill WATERSON. Calvin e Haroldo – E foi assim que tudo começou. Tradução de Luciano Machado e Adriana Schwartz. São Paulo: Conrad, 2010, p, 49.

6 V.S. NAIPAUL. Uma curva no rio. Tradução de Carlos Graieb. São Paulo: Companhia das Letras, 2004, p.10.

7 Arthur CONAN DOYLE. As aventuras de Sherlock Holmes. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Zahar, p.93.

8 V.S. NAIPAUL. Idem, p.10.

9 Arthur CONAN DOYLE. Idem, p.85.

10 Milton HATOUM.  Idem, p.18.

11 Arthur CONAN DOYLE. Idem, p.85.

12 J.K. ROWLING. Idem, p.25.

13V.S. NAIPAUL. Idem, p.149.

14 Arthur CONAN DOYLE. Idem, p.149.

15 Milton HATOUM. Idem, p.223.

Imagem: “Hair window”, pintura de Michael Landau, ou Kreativmichael.

MixLit 66: O que foi, o que virá

Houve um momento quando estava me aproximando dos trinta anos em que eu admiti que meu amor por aventuras já tinha acabado há muito tempo. Eu jamais iria fazer as coisas que havia sonhado1 quando topamos entrar na vida do outro.2 Eu percebia, e ela percebia que eu percebia, mas nenhum de nós dizia nada.3 Eu me lembro4: Empurro-a contra parede, tento penetrá-la, mas não consigo, então sentamos na privada e tento, mas também não conseguimos. Tentamos de todo jeito, mas não dá. Ela continua segurando meu pau como se fosse um salva-vidas, não adianta.5 A vela está quase a extinguir-se.6 Simplesmente não posso. Não poderei nunca mais.7

Tudo tem um fim; o mais amplo recipiente acaba ficando cheio.8 A vida é engraçada, não é?9 No fundo, uma questão de invenção, de inventar antes dos outros, de adiantar-se na criação de novas formas e de fazê-las sempre novas.10 Nem sei o que eu ainda estou esperando.11

holmes-sketch


1 Julian BARNES. O sentido de um fim. Tradução de Léa Viveiros de Castro. Rio de Janeiro: Rocco, 2012, p.101.

2 Fernando MOLICA. O livro branco (Vários autores. Organização de Henrique Rodrigues). Rio de Janeiro: Record, 2012, p.91.

3 Henry JAMES. A volta do parafuso – seguido de Daisy Miller. Tradução de Guilherme da Silva Braga. Rio Grande do Sul: L&PM, 2008, p.14.

4 Julian BARNES. O sentido de um fim, p.9.

5 Henry MILLER. Trópico de Câncer. Tradução de Beatriz Horta. Rio de Janeiro: José Olympio, 2006, p.22.

6 Graciliano RAMOS. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 1985, p.188.

7 Carson MCCULLERS. Conto: Wunderkind. Livro: A balada do café triste. Tradução de Caio Fernando Abreu. São Paulo: Círculo do Livro, 1987, p.102.

8 Robert Louis STEVENSON. O médico e o monstro. Tradução de Heloisa Jahn. São Paulo: Ática. São Paulo, 1996, p.90.

9 Scott ADAMS. Dilbert – Preciso de férias! Rio Grande do Sul: L&PM, 2010, p.84.

10 César AIRA. As noites de flores. Tradução de Paulo Andrade Lemos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006, p.57.

11 César CARDOSO. Conto: That’s all folks. Livro: É assim que o mundo acaba (Vários autores. Organização de Flávia Iriarte e Daniel Russel Ribas). Rio de Janeiro: Oito e Meio, 2012, p.30.

Imagem retirada daqui.

MixLit 65: Os sumiços

Interrompemos a nossa emissão para avançar com uma notícia de última hora: Há 24 h que são reportados desaparecimentos, em diferentes locais, de pessoas que se encontravam a ler.1

.

O que o jornalista dizia era interessante, mas Tomas não conseguia se concentrar em suas palavras. Pensava no filho.2 Sempre lendo romances.3 Chegava em casa muito tarde, esgotado e devastado pel4o amor aos livros.5

– Todo mundo está apavorado.6 Duas irmãs foram mortas em casa, porque não trancaram a porta direito.7 – Sua esposa lhe disse8, prestes a desabar em lágrimas.9 

– É mesmo?

– Foi o que me disseram  – disse sem muita convicção.10 Ela só queria11 encontrar um barco que aceitasse retirá-los da cidade.1    

– Quanto tem? – perguntou ele,13 pasmo, os punhos cerrados.14

MixLit 65 walking-away

– Pouco.15

– Porcaria16 Como…? – balbuciou e depois parou.17 – Onde vou arranjar dinheiro?18  – começou a se mexer e depois a correr e a fugir19, com seu baú e suas trouxas, sem se despedir.20

O filho de Tomas21 chegou enfim22 lendo23 um livro na mão.24 A mãe do menino então25 se jogou no seu pescoço e chorou como uma criança, chamando-o de meu pequeno isso e meu pequeno aquilo.26 Abraçados pela cintura, ficaram de pé no alto da escada. Embaixo, viram três homens mascarados com fuzis nas mãos. Era inútil hesitar, pois não havia maneira de fugir.27



1 Patrícia PORTELA. Para cima e não para norte. Lisboa: Caminho, p.175.

2 Milan KUNDERA. A insustentável levaza do ser. Tradução de Teresa Bulhões Carvalho Fonseca. São Paulo: Companhia das Letras, p.242.

3 Italo CALVINO. Se um viajante numa noite de inverno. Tradução de Nilson Moulin. São Paulo: Companhia das Letras, p.50.

Bruno SCHULZ. Ficção completa. Tradução de Henryk Siewierski. São Paulo: Cosac Naify, p.69.

João TORDO. O bom inverno. Rio de Janeiro: Língua Geral, p.52.

Woody ALLEN. Sem plumas. Tradução de Ruy Castro. Rio Grande do Sul: L&PM, p.51.

Woody ALLEN, idem.

Yasunari KAWABATA. O país das neves. Tradução de Neide Hissae Nagae.São Paulo: Estação Liberdade, p.80.

Raphael MONTES. Suicidas. São Paulo: Benvirá, 2012, p.227.

10 Julian BARNES. O sentido de um fim. Rio de Janeiro: Rocco, p.31.

1Henry MILLER. Trópico de Câncer. Tradução de Beatriz Horta. Rio de Janeiro: José Olympio, p.278.

12 Rui TAVARES. O pequeno livro do grande terramoto. Lisboa: Tinta-da-China, p.110.

1Henry MILLER, idem, p.285.

14 Raphael MONTES, idem.

1Henry MILLER, idem, p.278.

1Daniel MACIVOR. A primeira vista/In on it. Tradução de Daniela Avila Small. Rio de Janeiro: Cobogó, p.156.

1Kurt VONNEGUT JR. Matadouro número 5. Tradução de George Gurjan. Rio de Janeiro: Artenova, p.49.

1Luiz Alfredo GARCIA-ROZA. Fantasma. São Paulo: Companhia das Letras, p.82.

1Milan KUNDERA, idem, p.342.

20 Bruno SCHULZ, idem, p.245.

2Milan KUNDERA, idem, p.243.

2Milan KUNDERA, idem, p.242.

2Julian BARNES, idem, p.123.

2João TORDO, idem.

25 Kurt VONNEGUT JR, idem, p.135.

2Henry MILLER, idem, p.278

27 Milan KUNDERA, idem, p.342.

Ilustração por Lauren Nassef.

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Nos últimos meses, o MixLit foi notícia em diversos veículos. Gostaria de indicar especialmente dois. Em dezembro saiu um artigo de Luiza Miguez, jornalista da revista Piauí, no novo site do Itaú Cultural. Luiza ganhou uma bolsa para escrever esse artigo durante todo o ano de 2012. Ela fez entrevistas comigo e com muitas outras pessoas, estudou o tema a fundo e frequentou uma das Oficinas de remix literário que dei nesse ano que está terminando. O artigo, intitulado “Os DJs da Literatura” traz comentários de Heloísa Buarque de Hollanda e José Castello, e tem como personagens principais Mário de Andrade – um dos cabeças do movimento de antropofagia, autor de “Macunaíma” -, os norte-americanos Kenneth Goldsmith (autor de Uncreative Writing) e Mark Amerika (autor de remixthebook), e eu. Você pode ler o divertido e bem-humorado artigo aqui. A segunda matéria que gostaria de recomendar está no site BaixaCultura, um site que frequento bastante e que traz notícias e ensaios sobre cultura digital, cultura hacker, arte de vanguarda, copyright e copyleft, creative commons e outros assuntos contemporâneos. Leonardo Foletto, jornalista autor de “Efêmero revisitado – conversas sobre teatro e cultura digital”, é o principal responsável pelo site e fez uma entrevista muito estimulante comigo, na qual fomos desde o processo criativo até a maneira como a cultura do compartilhamento nas redes sociais tem influenciado a criação artística . Você pode encontrar “A literatura sampleada do MixLit” aqui.

Um abraço,
Leonardo Villa-Forte.

MixLit 64: Ela com os dela, eu com os meus

Apoiando o dorso das mãos na testa e ronronando impaciente1, Beatriz enfim ergueu os olhos atentos do papel amarelo – ela acabava de ler a expressão2 todo muro é um tanto confuso3. Pronuciava a frase diante do espelho em voz baixa4 e com as próprias palavras ia-se excitando. Os olhos brilhavam5 metidos à procura de um ponto fixo, abstrato, que a fizesse encontrar uma resposta para uma pergunta sem resposta6, à espera de que alguma coisa, qualquer coisa, acontecesse7.

Fingi mais uma vez que não via nada8. Falei que ia embora9.

Quietos estamos salvos10, cada qual com seus demônios11.









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1 Daniel GALERA. Dentes guardados. Rio Grande do Sul: Livros do Mal, 2004, p.9.

2 Cristovão TEZZA. Um erro emocional. Rio de Janeiro: Record, 2010, p.57.

3 Ricardo DOMENECK. A cadela sem Logos. Rio de Janeiro/São Paulo: 7Letras/Cosac Naify, 2007, p.98.

4 Bernardo AJZENBERG. Olhos secos. Rio de Janeiro: Rocco, 2010, p.11.

5 Luandino VIEIRA. A cidade e a infância. São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p.40.

6 Valter HUGO MÃE. A máquina de fazer espanhóis. São Paulo: Cosac Naify, 2011, p.146.

7 André DE LEONES. Dentes negros. Rio de Janeiro: Rocco, 2011, p.36.

8 Bruna BEBER. “Baixo orelhão”. Em: Liberdade até agora – uma antologia de contos. Organização de Eduardo Coelho e Márcio Debellian, Rio de Janeiro: Móbile, 2011, p.45.

9 Luiz RUFFATO. O livro das impossibilidades. Rio de Janeiro: Record, 2008, p.75.

10 Laura ERBER. Os corpos e os dias. São Paulo: Editora De Cultura, 2008, p.49.

11 José REZENDE JR. Eu perguntei pro velho se ele queria morrer. Rio de Janeiro: 7Letras, 2009, p.70.

Este MixLit com apenas autores de língua portuguesa foi publicado sob o título de “E o muro se ilumina” na terceira edição da Revista Pessoa.

MixLit 63: Os noivos

Naquela mesma noite, Emilia mentiu pela primeira vez para Julio, e a mentira foi1: não sou virgem.2

Ele não sabia o que dizer. Filho único, internato só de meninos – não sabia como falar com uma mulher quando as coisas davam errado.3 A verdade não se comunica4, cada um que entra imagina ser o primeiro a entrar.5

Levantou o rosto, apertou os olhos, estremeceu. A sua face doía. E quando pensava em levantar-se, logo desistia.6

Um estado de contemplação associado a uma respiração forte começou a acalmá-lo e, enquanto os ombros baixavam em verdadeiro relaxamento, lhe veio a ideia7: Largar o cobertor, a cama, o medo, o terço, o quarto, largar toda simbologia e religião; largar o espírito, largar a alma, abrir a porta principal e sair.8

 Emilia9 permaneceu deitada com o corpo tensionado10 em silêncio, o silêncio mais longo que já houvera entre eles.11


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1 Alejandro ZAMBRA. Bonsai. Tradução de Josely Vianna Baptista. São Paulo: Cosac Naify, 2012, p.21.

2 Nicolas BEHR. Poesia marginal – Poeta marginal? Eu, hein? No site do autor: http://www.nicolasbehr.com.br/pagpoesiamarg.htm

3 Ian MCEWAN. Serena. Tradução de Caetano Galindo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p.79.

4 Elaine PAUVOLID. O silêncio como contorno da mão. Rio de Janeiro: Multifoco, 2011, p.61.

James JOYCE. Ulysses. Tradução de Caetano Galindo. São Paulo: Companhia das Letras, 2012, p.1029.

6 Nilton RESENDE. Diabolô. Maceió: Editora da Universidade de Alagoas, 2011, p.55

7 Leandro JARDIM. Rubores. Rio de Janeiro: Oito e meio, 2012, p.65.

8 Antônio CÍCERO. A cidade e os livros. Rio de Janeiro: Record, 2002, p.8 na amostra distribuída durante a Flip em Paraty, 2012.

9  Alejandro ZAMBRA, idem.

10 Jennifer EGANA visita cruel do tempo. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2011, p.16 na amostra distribuída durante a Flip em Paraty, 2012.

11 Jennifer EGAN, idem.